O aproveitamento dos garotos formados na base rubro-negra é assunto que costuma despertar paixões polarizadas e posições radicalmente antagônicas. Algo, diga-se, que virou padrão no jeito brasileiro de pensar, desde que desaprendemos a debater sem nos agredir e passamos a acreditar que quem discorda de nós é um imbecil.
Mas como em quase todas as discussões, essa é mais uma em que há coisas boas e más nos dois lados do campo.
Por uma questão de temperamento, costumo manter distância tanto do “tem que ser todo mundo da base” quanto do “não dá mesmo para aproveitar ninguém”. Gosto de dúvidas e busco o equilíbrio. Outro dia assisti a um documentário de Jorge Furtado sobre jornalismo, O Mercado de Notícias, em que é citado um mantra que circula nas boas redações do país: “Se você não está em dúvida, é porque você está mal-informado”. Genial.
Assumidamente mal-informado sobre a base rubro-negra, já que nunca tive paciência com torneios subdezessete ou subquinze, reafirmo aqui minhas dúvidas sobre o tema. Vamos a elas.
Creio que o fervor que manifestamos pela utilização da nossa base remete a tempos que se foram para não mais voltar. Há quinze ou vinte anos, o sonho da molecada era jogar no Flamengo ou no Vasco, ouvir a torcida gritar seu nome no Maracanã, vestir a camisa que foi do Zico ou do Roberto Dinamite. Acabou. Não está em questão o quanto isso é lamentável: simplesmente, assim é que é. O sonho dos nossos talentosos meninos de onze ou doze anos é ter o nome gritado no Camp Nou ou em Stamford Bridge, vestir a camisa que foi do Messi ou do Drogba.
Acabou esse papo de que os caras formados na base têm mais identificação com o clube e amor à camisa. No início desse ano pudemos testemunhar o desmedido amor à camisa manifestado por Robinho, ao preterir o Santos que o revelou e se atirar nos braços do Atlético Mineiro. E olha que estamos falando de um jogador que passou a maior parte da carreira em clubes de ponta da Europa e, portanto, certamente rico.
Uma vez ouvi Casagrande fazer um comentáro que me deixou com algumas pulgas atrás das orelhas. Fã incondicional – igual a qualquer pessoa que goste de futebol e tenha o mínimo de bom senso – daquele nosso time com Zico, Júnior, Adílio etc., Casagrande defendia uma tese controversa: apesar do saldo extraordinariamente positivo, aquela geração deixara para o clube algo semelhante a uma herança maldita: a falsa ideia de que bastava vestir a camisa rubro-negra para qualquer garoto achar que era um fora de série. Há vários exemplos para atestar que a tese de Casagrande não deve ser desprezada. Aliás, cadê Jajá, que muitos já tinham na conta de craque?
Ciente de que a globalização e o estupidilhante volume de dinheiro que passou a girar junto com a roda do futebol mudaram radicalmente expectativas e sonhos dos meninos brasileiros bons de bola, cultivei um certo ceticismo quanto às vantagens automáticas de se usar a base. Para reforçar isto, há o histórico recente: dos catorze caras que entraram em campo no Maracanã em 6 de dezembro de 2009, para vencer o Grêmio por dois a um e conquistar nosso último título verdadeiramente importante, apenas um frequentou a base. Adriano.
(Antes que me apedrejem, vamos combinar: ganhar a Copa do Brasil é bacana pra caramba, sobretudo pela emoção dos mata-matas, mas não dá para comparar. Ganhamos a Copa do Brasil de 2013 enfrentando apenas dois dos outros onze grandes do futebol brasileiro. De qualquer modo, se quisermos forçar a barra e incluir a Copa do Brasil na categoria dos títulos importantes, o argumento permanece válido: dos catorze jogadores que entraram em campo em 27 de novembro de 2013, para vencer o Atlético Paranaense por dois a zero e garantir o caneco, apenas um veio da base. Luiz Antônio.)
Também há exemplos além da Gávea, como o Corinthians campeão da Libertadores 2012 e o Atlético Mineiro campeão da Libertadores 2013. Resumo dessa ópera contemporânea: não faz sentido ligar empenho, comprometimento, vitórias e títulos ao fato de ter pertencido à base. Já foi o tempo.
Entretanto, convém olhar com cuidado para o outro lado da moeda, ainda mais se batermos uma foto deste momento do futebol rubro-negro. Assim, passemos a um longo parágrafo que reproduz o antigo passatempo de unir os pontos.
Ponto 1: logo após a conquista da Copinha, Léo Duarte, Ronaldo e Felipe Vizeu foram incorporados ao elenco principal. Ponto 2: o Flamengo passou boa parte de 2015 ameaçando disputar o campeonato estadual de 2016 com um time reserva, numa demonstração inequívoca de que o torneio não era prioridade. Ponto 3: temos um volante – posição de Ronaldo – unanimemente contestado pela torcida. Ponto 4: idem para dois dos nossos zagueiros, posição de Léo Duarte. Ponto 5: fizemos o nosso centroavante – posição de Felipe Vizeu – entrar em campo para enfrentar o Vasco menos de 24 horas depois de ter defendido a seleção peruana na partida contra o Uruguai, após uma viagem que começou em Montevidéu, fez escala no Rio e terminou em Brasília. Ponto 6: em rápida entrevista antes do clássico, Muricy afirmou que Guerrero provavelmente jogaria 45 minutos, quem sabe 60. Permaneceu em campo o tempo inteiro. Ponto 7: depois que Felipe Vizeu fez duas más partidas, contra Atlético Paranaense e Volta Redonda, Muricy disse que “se você tira o moleque, você queima o moleque”. Pode ser. Mas a miniepopéia de Guerrero para enfrentar o Vasco e sua manutenção em campo durante os 90 minutos foram queimação muito maior. Menos confiança no moleque, impossível. Ponto 8: se o campeonato é tão pouco importante a ponto de cogitarmos disputá-lo sem os titulares, por que não aproveitar para lançar os garotos? E se não foi agora, quando os lançaremos, no Brasileirão? Ponto 9: salvo engano meu, no jogo de sábado com o Boavista nosso treinador levou para o banco Alex Muralha, Pará, César Martins, Márcio Araújo, Ederson, Gabriel e Emerson. Ninguém da base. Vizeu ainda tinha a desculpa da apresentação à seleção subvinte no dia seguinte, mas o que dizer dos outros dois? Ponto 10: Gérson e Douglas vivem participando dos jogos do Fluminense, Caio Monteiro tem entrado constantemente no Vasco, Ribamar no Botafogo, Gabriel Jesus no Palmeiras. Todos eles nasceram em 1997, vêm tendo oportunidades, enfrentando adversários fortes e sendo testados. Todos, menos os nossos, que parecem o John Travolta de O Garoto na Bolha de Plástico, requerem cuidados especiais, são mantidos numa redoma, não podem substituir nem ser substituídos, não devem apanhar nem bater, não encaram o Vasco nem o Boavista. Ao contrário dos pastéis que a avó de Adriano fritava para o futuro Imperador levar aos treinos, ficamos com a sensação de que os nossos atuais meninos são acostumados com sucrilhos no prato.
Bom: e o que foi que apareceu com a união desses dez pontos? Simples: como canta Criolo, que aparece na foto que ilustra este post homenageando o RP&A com o gesto-símbolo do blog, saltou no papel a frase “saber a hora de parar é pra homem sábio”. Já passou da hora de saber que é preciso parar com alguns dos nossos caras tão testados e pouco aprovados, e jogar a molecada no fogo. Os que forem bons de verdade vão sobreviver.
Jorge Murtinho
Fonte: República Paz & Amor
Texto imenso e prolixo… Escreveu muito para falar realmente pouco ou nenhuma novidade! Amor a camisa acabou a muito tempo meu caro!! Isso todo mundo sabe!! E não venha dizer q o jogador quer ouvir o seu nome gritado na Europa pq tambem está errado! Jogador quer DINHEIRO!! E tudo aquilo que o dinheiro lhe proporcionará! Titulos, recordes e identificação com torcida são para pouquissimos jogadores! Isso é consequencia e não meta do atleta! O jogador hoje vai para onde está o dinheiro, que é o seu verdadeiro ideal em ser jogador ( pelo menos para maioria)!! No Brasil o ultimo a jogar com verdadeiro amor à camisa foi Rogerio Ceni! E será dificil ter outro… Se o Brasil pagasse mais que Europa, China e mundo Árabe vc acha que os melhores jogadores e os jogadores brasileiros iriam jogar onde???? Claro q ficariam por aqui!! Messi, Neymar, Cristiano Ronaldo, Suarez e companhia limitada estariam jogando toda quarta e domingo no Carioqueta, Lampions League, Brasileiro, Libertadores e etc!
Não quer dizer nada falar que só enfrentamos 2 dos 12 grandes, já que os times que disputaram a Libertadores entraram nas fases finais e foram eliminados na bola, por times como Goiás, Atlético PR e entre os 12 grandes. Fora que enfrentamos times na parte de cima da tabela do campeonato nacional mais importante nas fases finais. É um titulo importante. SRN
Gostei. É exatamente do que precisamos. Chega de mimimi.
Nao botar o Vizeu contra o Vasco foi bom senso, ele não ia meter gol, mais fácil deixar o Guerrero que é experiente.
Nunca respondo quem não concorda,como vc falou hj,meia palavras errada ou mal entendida,é a senha p uma discussão ou briga,no mundo real ou internet. Sobre a base,o erro foi sempre o tido como “novo Zico”, ou craque,já se sentia isso, e cercado de puxa-sacos,a promessa naufragava.Sempre o mesmo discurso; ” Fui injustiçado no Flamengo “,saia e não era titular nem em times de série D.A realidade da base do Flamengo(fora essa),tem sido pior q até o Buaatafogo, Adryan,reserva num ex time de série B,da França, Erick Flore(,Boa vista)Fabiano Oliveira(Tigres/RJ),Vinícius Pacheco (Volta Redonda).Em comum,todos tidos como promessas,craques. Todos Fracassados.A culpa do fracasso,é do Flamengo,ou a ruindade prevaleceu?