A receita é antiga, mas ainda muito utilizada por inúmeros clubes brasileiros. Faz parte de um planejamento, um investimento a longo prazo. Desde os primórdios do futebol, jovens atletas, que ostentam o status de promessa e levam consigo a esperança de um dia despontar, são emprestados a outras equipes com o intuito de ganhar experiência, esperteza, malandragem. Parecido com o processo de lapidação de um diamante: o valor está ali, basta aperfeiçoá-lo. Os clubes cariocas, lógico, não fogem a essa regra. Este ano, no entanto, a maioria deles preferiu não espalhar seus atletas e decidiu deixá-los bem perto de “casa”. São nos clubes de menor expressão do Rio de Janeiro, que disputam a Série C do Brasileirão, onde se concentram algumas das pratas de Botafogo, Fluminense, Flamengo e Vasco.
A motivação para a insistência dessa tática está no recente caso de Wellington Nem. Criado no Fluminense, o atleta foi emprestado ao Figueirense, ainda com pouco status. No Figueira, teve seu futebol aprimorado, foi fundamental na campanha da equipe que terminou em sétimo no Brasileiro de 2011 e ainda recebeu o prêmio de revelação da competição. Com a experiência adquirida, voltou ao Flu em 2012 e se destacou no elenco que levantou a taça de campeão brasileiro. Recentemente, foi negociado com o Shakhtar Donetsk pelo valor estipulado em R$ 25 milhões.
Com a atual estrela do futebol ucraniano no foco, sete promessas do trio de grandes cariocas disputam, longe dos holofotes, a Série C do Brasileiro pelas equipes do Macaé, Duque de Caxias e Madureira. Alguns já foram bastante utilizados na equipe principal de seus clubes, como é o caso do meia Bruno Tiago, que pertence ao Botafogo, e está emprestado ao Tricolor Suburbano. Outros, de tanto serem emprestados, se tornaram ídolos de seus times “temporários”. E ainda há aqueles que não passam de desconhecidas promessas.
– Lógico que eu quero voltar para o Fluminense ou para outro time grande. Estou aqui para pegar experiência e aparecer – conta o jovem atacante Stéfano, emprestado pelo Fluminense este ano ao Madureira.
Botafogo é o que mais investiu
Com uma equipe sólida, um técnico em paz com a torcida e um recente título de campeão carioca, o Botafogo se deu o luxo de ser o clube que mais emprestou jogadores aos primos pequenos cariocas. Ao todo, o Glorioso cedeu três jovens: os volantes Araruama e Rodrigo Dantas e o meia Bruno Tiago.
Aos 23 anos, Rodrigo Dantas foi formado nas categorias de base do Alvinegro. Com apenas 26 jogos pela equipe profissional, o volante perdeu espaço na equipe, principalmente pela grande concorrência no setor de meio de campo. Por conta disso, a diretoria o emprestou para o Macaé este ano. Rodrigo, no entanto, ainda não estreou porque só teve sua situação regularizada esta semana. Além do Macaé, ele também acumula no currículo passagens por Portuguesa-RJ, América-RN, Duque de Caxias, Vasteras SK, da Suécia, e Estoril, de Portugal.
– Para ser sincero e realista, não penso no Botafogo no momento. Esse é o meu quinto empréstimo e tudo que eu quero é fazer um bom trabalho no Macaé, onde tenho contrato até maio. Se eu voltar pro Bota depois do empréstimo, bom. Se não voltar, vou seguir minha carreira – revelou o volante.
Outro nome esquecido no elenco do Botafogo é o do garoto Araruama, de 23 anos. Ao contrário de Rodrigo, ele não foi formado na base, mas contratado em 2010. No entanto, uma lesão no ombro sofrida durante os primeiros jogos pelo Bota o afastou do grupo, e o jogador perdeu espaço na equipe. Desde então, passou a ser emprestado a outros clubes. Araruama já passou por Olaria, Joinville e disputou o Carioca deste ano pelo Bangu. Agora, está no elenco do Duque de Caxias, mas também ainda não estreou, pois não teve sua situação regularizada junto à CBF.
Diferente dos companheiros, Bruno Tiago já construiu seu nome no Botafogo. Com 23 anos, o meia foi bastante utilizado na era de Joel Santana e se destacou no Campeonato Brasileiro de 2010. Com a chegada de Caio Júnior, logo em seguida, o jogador deixou de ser inclusive relacionado para o banco em diversas ocasiões. Sem espaço, foi emprestado ao Madureira este ano, clube que defendia antes de ser contratado pelo Glorioso. Ao contrário de Rodrigo Dantas e Araruama, Bruno Tiago é titular do meio-campo Tricolor Suburbano na Série C do Brasileirão. Contra o Duque de Caxias, no último fim de semana, foi dele o passe para o gol do zagueiro Daniel.
Fluminense e os discípulos de Fred
O ataque do Fluminense não tem outro nome há anos que não seja o de Fred. A posição de atacante de referência está muito bem ocupada pelo mineiro, atual titular também da seleção brasileira. Além disso, o Tricolor tinha Rafael Moura até recentemente e hoje conta com o xará Sóbis como substituto imediato. Vindos da base, Marcos Júnior e Samuel também já tiveram suas oportunidades.
Agora, na fila de espera da base de Xerém, estão os atacantes Bruno Veiga e Stéfano. O primeiro já é ídolo. Não no Fluminense, mas no Duque de Caxias, clube que defende atualmente e por onde já passou em 2012. Na época, o garoto marcou sete gols e foi fundamental na campanha da equipe na Série C do Brasileiro. Bruno é ainda o maior artilheiro da história das categorias de base do Flu, com mais de 170 gols. Já passou também por Joinville, Boavista e Náutico. Ele é titular absoluto no grupo comandado pelo técnico Mário Marques e, no último fim de semana, contra o Madureira, marcou um belo gol, mas o time acabou derrotado por 2 a 1.
– Cheguei no Fluminense com 10 anos. Tenho muito carinho e respeito pelo clube. Só fiquei um pouco chateado na época da minha saída. Mas não posso culpar o Flu, e sim as pessoas que lá estavam. Tive poucas chances, mas tenho o sonho de voltar. Tenho mais a oferecer, só que isso depende de vários fatores – disse o atacante, na primeira passagem pelo Duque.
Stéfano, por sua vez, está nas categorias de base do Flu desde 2008 e direto de lá começou sua peregrinação. Passou pelo Guaratinguetá e, antes de acertar seu empréstimo ao Madureira, estava no Colorado Rapids, dos Estados Unidos. Aos 22 anos, o atacante entrou como titular nas três primeiras partidas do Madureira neste Brasileiro, mas ainda não marcou. Na última rodada, o técnico Alexandre Gama resolveu testar outro atleta na posição. A tendência é que a vaga fique ainda mais disputada quando Lenny, ex-Flu e Palmeiras, tiver condições de jogo.
Futura sombra de Léo Moura
A exemplo de Fred, no ataque do Fluminense, a lateral do Flamengo também tem apenas um dono há anos: Léo Moura. Porém, aos 34 anos, o capitão do Rubro-Negro não tem mais o mesmo rendimento como nos anos de 2007 e 2008, por exemplo, período em que inclusive foi convocado para a seleção brasileira. Como seu substituto, já passaram Rafael Galhardo, Everton Silva e Wellington Silva. No último jogo do Fla, o garoto Digão foi quem assumiu a posição. Mas uma outra possível sombra do “eterno moicano” também existe e foi emprestado ao Madureira este ano: o lateral-direito Yago, de 21 anos.
Yago foi revelado nas categorias de base do Vasco e pintou, em 2011, como uma grande promessa do Cruzmaltino, mas acabou deixando o clube alegando estar insatisfeito com a maneira que a diretoria conduzia as categorias de base. Em seguida, acertou com o Flamengo, onde ainda não disputou uma partida na equipe principal. O empréstimo ao Madureira foi acertado este mês, mas Yago também ainda não estreou.
Conhecido em outro Vasco
O Vasco entra nessa lista com o empréstimo do jovem Washington, de apenas 21 anos, ao Duque de Caxias. Com um currículo pequeno, o meia saiu do Gigante da Colina em ocasiões anteriores apenas para defender um outro Vasco, o de Sines, de Portugal. Lá, ele disputou a temporada de 2012 e depois retornou ao Rio. Pelo Duque, Washington fez sua estreia neste último fim de semana, contra o Madureira.
Mas o que chamou a atenção do clube foi o período de testes que o garoto fez antes de ser contratado. O meia disputou alguns jogos e deixou sua marca contra o Duquecaxiense e Miguel Couto, impressionando o técnico Mário Marques, que pediu sua contratação. Tudo indica que o jovem será utilizado com frequência na equipe, que ocupa a vice-lanterna do Grupo B do Brasileirão, com apenas um ponto somado.
Fonte: GE